O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), tem conduzido com velocidade incomum o julgamento da denúncia contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outras 33 pessoas, da qual é relator.
Elas são acusadas de integrar a chamada “trama golpista” de 2022, um suposto plano para articular um golpe de Estado depois da vitória de Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições presidenciais daquele ano.
A denúncia, apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) em 18 de fevereiro de 2025, foi analisada pela Primeira Turma do Supremo na última terça-feira, 25 – apenas 35 dias depois de sua formalização. Essa celeridade é 14 vezes superior ao ritmo do julgamento do escândalo do Mensalão, um dos casos mais emblemáticos da história do tribunal.
A pressa no andamento do processo não é casual. O STF busca garantir que o julgamento do mérito ocorra ainda em 2025, a fim de evitar que o caso se arraste até 2026, ano de eleições federais. Moraes teme que a proximidade das eleições possa influenciar politicamente o desfecho do caso ou seja explorada por apoiadores de Bolsonaro.
A condução veloz do caso não é uma novidade na atuação de Alexandre de Moraes, conhecido por imprimir rapidez em processos de grande repercussão, especialmente aqueles ligados a Jair Bolsonaro e seus apoiadores.
Caso surpreende por agilidade
Comparado a outros casos históricos, como o Mensalão e a denúncia contra Fernando Collor, o processo da “trama golpista” destaca-se pela agilidade. No caso do Mensalão, relatado pelo então ministro Joaquim Barbosa, o recebimento da denúncia levou um ano e cinco meses depois de sua apresentação, em 30 de março de 2006.
O tempo é 14 vezes maior do que o transcorrido na análise do recebimento da denúncia contra Bolsonaro pela suposta trama golpista. A digitalização de quase 14 mil páginas do inquérito foi um dos fatores que contribuíram para a demora à época, enquanto o plenário do Supremo precisou de cinco dias para decidir sobre os 40 acusados, que só se tornaram réus em agosto de 2007.
Já no caso de Collor, condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro em maio de 2023, a denúncia apresentada em agosto de 2015 só foi recebida pelo STF dois anos depois, em agosto de 2017.
Collor foi condenado pelo STF em maio de 2023. O ex-presidente apresentou o segundo recurso contra a sentença no começo deste mês, sem inaugurar o cumprimento da pena de oito anos e dez meses de prisão.
Cronologia da denúncia contra Bolsonaro
A rapidez do processo contra Bolsonaro pode ser observada em sua cronologia. Em 27 de abril de 2023, o ex-presidente prestou seu primeiro depoimento à Polícia Federal (PF) sobre os ataques de 8 de janeiro. Em 9 de setembro do mesmo ano, Moraes homologou o acordo de colaboração premiada de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, com a PF.
A investigação ganhou fôlego em 2024, com operações policiais em 8 de fevereiro e 19 de novembro, esta última contra um grupo que supostamente planejou assassinar Lula, o vice-presidente Geraldo Alckmin e o próprio Moraes.
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, afirma que o processo contra Bolsonaro é ‘complexo’ | Foto: Tânia Rego/Agência Brasil/Arquivo
O relatório final da PF, concluído em 21 de novembro de 2022, indiciou Bolsonaro e outras 36 pessoas pela articulação de um golpe. A denúncia formal da PGR veio em 18 de fevereiro de 2025, e, no dia seguinte, Moraes notificou os acusados para apresentarem suas defesas em 15 dias.
Em 7 de março, quando o período se encerrou, o ministro enviou os autos para o procurador-geral, Paulo Gonet, se manifestar em cinco dias, relata o texto. Horas depois de a PGR defender o recebimento da denúncia, Moraes liberou o caso para a Primeira Turma, e o presidente do colegiado, ministro Cristiano Zanin, marcou o julgamento para 25 de março.
Advogados de defesa comparam com outros casos
A velocidade imposta por Moraes contrasta não só com casos históricos, mas também com outros processos sob sua relatoria. No caso da deputada Carla Zambelli (PL-SP) e do hacker Walter Delgatti Neto, acusados de invadir o sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a denúncia foi formalizada em 23 de abril de 2024 e recebida em 21 de maio – menos de um mês.
Já os acusados pelo assassinato de Marielle Franco tiveram 42 dias entre a apresentação e o recebimento da denúncia. Por outro lado, a denúncia contra o deputado Bacelar Filho (PL-BA), apresentada em 2017, só o tornou réu em 2020.
À Folha de S.Paulo, as defesas dos acusados na trama golpista criticam o ritmo acelerado. Celso Vilardi, advogado de Bolsonaro, argumentou que “os autos têm um sem número de folhas” e que “seria impossível analisar toda a documentação no tempo estabelecido pelo Supremo”.
José Luis Oliveira Lima, defensor do general Walter Braga Netto, reforçou a dificuldade: “Empreender uma análise minuciosa de todo esse volume colossal de informações em 15 dias de prazo seria uma tarefa hercúlea.”
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