O ministro de Lula Lá e os cinco bancões

O ministro Alexandre Silveira está feliz da vida. A reeleição de Fuad Noman para prefeito de Minas Gerais, seu companheiro no PSD mineiro, pavimenta seu caminho político de mãos dadas com seu conterrâneo Rodrigo Pacheco, presidente do Senado. O que pode tornar essa caminhada mais difícil — para não dizer pouco iluminada — é o seu desempenho às escuras na pasta de Minas Energia. O que está sob escrutínio agora é um presente de R$ 7,8 bilhões que ele deu para cinco bancões brasileiros.   

Não é de hoje que o ministro está sob escrutínio. Basta lembrar a medida provisória (MP) em maio deste ano que ajudou os irmãos Joesley Batista e Wesley Batista a transformarem termelétricas deficitárias em superavitárias, além de subsidiar para a dupla a concessão da Amazonas Energia, igualmente uma distribuidora com as contas no vermelho. Agora, Alexandre Silveira se meteu em um imbróglio com os bancões que pode deixá-lo em maus lençóis com seu chefe, Luiz Inácio Lula da Silva, a quem — em recente bilhete de aniversário — chamou de “o maior líder da história do país”.

Até o quase sempre comedido prefeito reeleito de São Paulo, Ricardo Nunes, acaba de chamar Alexandre Silveira de incompetente. A razão é a novela que se arrasta sobre a distribuidora Enel, que, desde o ano passado, coleciona apagões colossais na maior cidade do Brasil a cada chuva mais forte na metrópole. Entre os executivos no setor elétrico, o ministro já é chamado de Alexandre “Rolando Lero” Silveira. A razão seria a prodigalidade dele no discurso e o imobilismo na gestão.

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Uma nota cômica sobre a situação somente poderia vir da presidente nacional do Partido dos Trabalhadores (PT), deputada Gleisi Hoffmann (PR). A parlamentar cobrou que o governo brasileiro auxilie Cuba, que enfrenta uma crise no sistema elétrico e os rastros deixados pelo furacão Oscar no país. Se é para pedir socorro nesse quesito, Alexandre Silveira não parece ser o mais competente.

O fracasso dos aliados de Lula

A verdade é que a comicidade não se deve apenas à líder do PT. Por meio de uma campanha intitulada “Ajude Cuba a se reerguer”, artistas, políticos e ativistas ligados à esquerda também querem o socorro brasileiro ao setor elétrico da ilha caribenha. Estão ali perfilados os suspeitos de sempre, tais como frei Betto, o ator José de Abreu, a ativista Marília Guimarães e o prefeito eleito de Maricá, Washington Quaquá (PT).

Se o caso fosse obter um patrocínio, Alexandre Silveira poderia ser mais eficiente. O ministro é conhecido por mobilizar patrocínios da Itaipu Binacional a eventos que considera estratégicos. Para se ter uma ideia desses empreendimentos, a grande empresa de energia está envolvida com um novo projeto extraordinário, ideia saída da mente da primeira-dama do país, dona Janja.

O projeto prevê o fornecimento de equipamentos de cozinha limpa para o preparo de refeições e a instalação de biodigestores. O equipamento transformará resíduos orgânicos em biogás, que será usado para cozinhar alimentos, com a promoção de um ciclo de uso sustentável. Ao cuidar desses interesses e de campanhas políticas, Alexandre Silveira já vai para o terceiro ano como ministro com a promessa — continuamente adiada — de reformar o tão combalido Sistema Elétrico Brasileiro (SEB).

A ajuda aos bancões

Longe disso, na verdade. Alexandre Silveira acaba de promover mais um curto-circuito no SEB. E, novamente, por meio de um novo embate com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Em reportagem do site Poder360, veio a público um documento até então sigiloso do órgão. Uma análise sobre a operação que permitiu a cinco bancões brasileiros embolsar R$ 7,8 bilhões: Banco do Brasil, Itaú BBA, Bradesco BBI, BTG Pactual e Santander.

Para entender esse dinheiro, é preciso se lembrar de dois empréstimos realizados no setor elétrico brasileiro junto ao setor financeiro. O primeiro foi feito em 2020, para socorrer as distribuidoras de energia, em razão da inadimplência decorrente da pandemia de covid-19. O segundo, em 2022, para pagar a contratação das termelétricas que foram ativadas no lugar das hidrelétricas impossibilitadas de operar por causa da estiagem. Essas dívidas contraídas somaram uma conta a ser paga por todos os consumidores nas suas contas de luz. Quando a Eletrobrás foi privatizada, ficou acertado que a parte da empresa nesse rateio seria de R$ 30 bilhões até 2030.

Veio, então, a matemática financeira de Alexandre Silveira. Para antecipar esse dinheiro todo, seria captado no mercado R$ 7,8 bilhões, com a garantia do dinheiro a ser pago pela Eletrobrás, algo que se chama no mercado de “securitização da dívida”. Como os recursos entrariam imediatamente, os consumidores poderiam parar de pagar mensalmente a quantia, o que deveria reduzir as suas contas de luz.

Os maiores beneficiados

Mesmos com os custos que uma operação de securitização acarreta, as contas do ministério das Minas e Energia garantiam a sobra de R$ 500 milhões para abater as contas de luz de todos os consumidores brasileiros. O desconto no boleto variaria de 2,5% a 10%, a depender da unidade da Federação. O problema é que os cálculos de Fernando Mosna, diretor da Aneel, em seu relatório de 43 páginas agora vazado, são bem diferentes das planilhas do ministro Alexandre Silveira.     

O benefício gerado para os brasileiros não foi de R$ 500 milhões. Foi bem menor. Ficou em apenas R$ 46 milhões. O que acabou por acarretar um desconto ínfimo na conta de luz, ou seja, de apenas 0,02%. A conclusão do relatório da Aneel, tal qual a regra futebolística para o juiz Arnaldo Cezar Coelho, é clara: “A operação não foi benéfica para os consumidores, mas sim aos credores do governo”.

Além de apontar esse desvio de função, o relatório da Aneel queria uma investigação do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre a lisura da operação de securitização da dívida. Todavia, o documento ficou até agora oculto, pois não obteve votos suficientes para sua aprovação. A votação acabou empatada em 2 a 2, em razão de a agência ter uma cadeira vaga de diretor, algo que imobiliza o órgão há meses. Mais uma das decisões que o ministro Alexandre Silveira não toma, pois o governo tem o direito de indicar um integrante para lugar. Cabe entender a quem interessa manter a Aneel tanto tempo em banho-maria.

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